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13/01/2023 às 15h52min - Atualizada em 15/01/2023 às 20h02min

Sem mudanças estruturais das mídias sociais tragédias podem se repetir

por Francisco Gomes Junior

SALA DA NOTÍCIA Tauana Marin
Máxima Assessoria
Divulgação


O código de conduta democrático, após um desgaste por décadas, começou a dar sinais de demência a partir de 2015. Personificar a decadência comportamental da política em personagens como Trump, Orban, Le Pen ou Bolsonaro é simplificar e reduzir a intolerância a posturas individuais, deixando de considerá-la uma transformação em parte da sociedade e analisar suas causas.

Perdeu-se inicialmente parte do sistema de governança, não somente do ponto de vista formal, mas em sua essência. Passou-se a governar por mídias sociais, sobretudo pelo Twitter, assim, temas antes debatidos nos espaços políticos perderam o contraditório. O governante passou a postar opiniões sem divergência e habituou-se, paulatinamente, a ditar a narrativa dos fatos de acordo com seu interesse.

Se na década de 80 questionar pontos da globalização era algo como uma visão retrógrada, certamente manifestar a convicção de que as mídias sociais diminuem o debate democrático, ao contrário do que se propõem, também gera a reação negativa dos empolgados com o progresso digital. E não se trata de criticar a massificação dos meios de manifestação, não se trata de achar, como já foi dito, que as redes sociais deram voz a muitos imbecis, mas sim de constatar que debates se tornam mais rasos e com conclusões mais rápidas e radicais.

Com esse mecanismo de captura de fãs seguidores, políticos perceberam a facilidade de fidelizarem eleitores e formarem adeptos que os seguem como a líderes de seitas. E perceberam que quanto mais radicalizam em opiniões, mais engajamento conseguem, o que redunda em maiores votações nos pleitos eleitorais.

A rede social permite a acusação sem prova, a distorção e invenção de fatos, a criação de teorias sem sustentação científica, a heroica lacração, o vitimismo e a mentira deslavada. E que não se ouse falar em regulação dessas mídias sociais, o que representa uma tentativa absolutista de tolher a liberdade de expressão.

Esse uso das mídias cria convertidos fundamentalistas prontos a seguir orientações de seus líderes, quaisquer que sejam. Isso propicia que políticos mal-intencionados planejem ações de curto e médio prazo, inclusive para gerar desestabilizações de maior ou menor grau. A tomada do Capitólio assim foi gestada e a tentativa golpista quartelada em Brasília (DF) é filhote do mesmo modus operandi.

É necessário ter consciência do funcionamento dessas mídias, para não acharmos que atos fundamentalistas desestabilizadores são pontuais ou isolados. Infelizmente, tudo indica que assim não o será.

Após o tombo e frustração dos arroubos golpistas, os fãs clubes serão reconstruídos ou migrarão para novos personagens. E, sem mudanças estruturais que melhorem o funcionamento das mídias sociais nas mãos das big techs, tragédias podem se repetir e até mesmo tornarem-se mais graves, já que o golpista frustrado de hoje aprenderá com seus erros e voltará com mais planejamento em suas próximas ações maléficas.

Por isso, espera-se que o mundo jurídico não seja analógico em um mundo digital, que não seja positivista ou se perca em juridicismos que gerem impunidade com base em tecnicismos. Se a punição não vier, ou demorar a vir, a seita será retroalimentada e em breve dará novo sinal de vida.

E mesmo com a punição, sem alterações estruturais, a história se repetirá, ainda que como farsa.

Francisco Gomes Júnior - Advogado Especialista em Direito Digital. Presidente da Associação de Defesa de Dados Pessoais e do Consumidor (ADDP). Autor da obra “Justiça sem Limites” Instagram: @franciscogomesadv

 

 

 

 

 

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