Pessoas com transtorno do espectro do autismo tendem a apresentar muito mais distúrbios de sono em comparação à população em geral. Um estudo da Vanderbilt University Medical Center, nos Estados Unidos, publicado em abril de 2022, na revista Sleep Medicine, revelou que este porcentual pode chegar a 86% em pessoas de 6 a 30 anos com o transtorno. Pesquisa realizada pelo Instituto do Sono mostrou que 6 em cada 10 crianças e adolescentes com autismo dormem no quarto dos pais. Outro problema apontado é que elas são 4,6 vezes mais propensas a permanecerem acordadas mais de 30 minutos ao longo da noite em comparação aos indivíduos da mesma idade sem esta condição.
“A privação de sono modifica o comportamento de crianças e adolescentes com autismo, provocando agressividade, irritabilidade, desatenção e hiperatividade. Com a crise sanitária, os distúrbios de sono aumentaram, abalando ainda mais o cotidiano das famílias”, afirma a Professora Doutora Sandra Doria Xavier, médica e pesquisadora do Instituto do Sono, que coordenou o estudo.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), os transtornos do especto do autismo são um grupo de condições, que se caracterizam por algum grau de dificuldade com interação social e comunicação. Indivíduos com esta condição podem ter dificuldade de transição de uma atividade para outra, hiperfoco em determinado assunto ou objeto e hipersensibilidade tátil, auditiva ou visual, entre outras características.
No Brasil, estima-se que a população de pessoas com autismo seja de 4,84 milhões de pessoas. A estimativa é feita com base na prevalência nos Estados Unidos, onde 1 a cada 44 crianças com 8 anos é diagnosticada com o transtorno, como revela o relatório publicado pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) daquele país.
Sono e autismo
No mês da Conscientização Mundial sobre o Autismo, celebrado em abril, é muito oportuno avaliar a delicada relação entre esta condição e o sono. Em crianças com este transtorno, a causa dos distúrbios de sono é multifatorial. Inclui a má higiene do sono, alterações sensoriais e anormalidades na produção e metabolização de melatonina, um hormônio responsável pela regulação do sono.
A higiene do sono é composta por uma série de hábitos para auxiliar as pessoas a dormir. Entre eles estão estabelecer um horário regular para dormir e acordar, evitar eletrônicos pelo menos 1 hora que antecede o horário de ir se deitar assim como evitar o consumo de alimentos pesados ou a ingestão de bebidas com cafeína no período da noite.
Estudos apontam que a insônia em crianças com autismo atinge uma prevalência alta, de até 86%, sendo 2 a 3 vezes maior do que em crianças sem este transtorno. Os efeitos da privação de sono parecem ser mais intensos em crianças com autismo, com piora acentuada em seu comportamento.
Um estudo publicado em 2021, coordenado pela McGill University, no Canadá, encontrou que alunos com autismo que dormem pouco ou demoram para conciliar o sono quando pequenos apresentam piora da autorregulação comportamental nos anos subsequentes. A autorregulação é um código de conduta que a criança deve adquirir como a obediência às demandas e orientações dos adultos, o controle de respostas impulsivas e a participação em atividades específicas.
Além de comprometer a autorregulação comportamental, os distúrbios de sono das crianças comprometem a saúde mental das mães. É o que revela um estudo da Deakin University, na Austrália, com 234 mulheres com filhos com autismo. Os pesquisadores observaram que quanto mais graves são os problemas de sono das crianças, maior é o impacto sobre a saúde mental das mães. Os distúrbios de sono que mais causam o estresse materno são a dificuldade em pegar no sono e a duração de sono reduzida. “Esta constatação é muito significativa na medida em crianças com autismo demandam atenção e estímulos contínuos, o que não consegue ser feito de forma adequada com a família desestruturada emocionalmente”, explica Sandra Doria.
Sobre o Instituto do Sono
O Instituto do Sono é um centro de referência mundial em pesquisa, diagnóstico e tratamento em distúrbios de sono. Fundado em 1992 pelo Professor Sergio Tufik, é formado atualmente por mais de 100 colaboradores, entre eles médicos de diversas especialidades, técnicos, psicólogos, biólogos, biomédicos, dentistas, assistentes sociais, enfermeiras, fisioterapeutas, educadores físicos e pesquisadores. Além do atendimento à população, conta com uma área de educação continuada que já capacitou mais de 4.000 médicos e outros profissionais de saúde.
O Instituto do Sono faz parte da AFIP (Associação Fundo de Incentivo à Pesquisa), uma instituição privada, sem fins lucrativos e filantrópica, fundada por profissionais da área da saúde, professores universitários e pesquisadores há mais de 40 anos. Seu objetivo é fornecer suporte financeiro para atividades de docência, pesquisa científica e atendimento médico à população.