Marca afirmou que vendas em territórios buscados por palestinos são ‘inconsistentes’ com seus valores. Ação enfureceu autoridades israelenses: primeiro-ministro Naftali Bennett disse se tratar de ‘decisão imoral’. Sorvete sendo produzido em fábrica da Ben & Jerry’s em Waterbury, Vermont, em foto de 23 de março de 2010
AP Photo/Toby Talbot
A marca de sorvetes Ben & Jerry’s anunciou nesta segunda-feira (19) que irá parar de vender seus produtos na Cisjordânia ocupada por Israel e em Jerusalém Oriental, dizendo que as vendas nos territórios buscados pelos palestinos são “inconsistentes com nossos valores”.
O anúncio foi uma das críticas mais fortes feitas por uma empresa famosa em relação à política de Israel de estabelecer seus cidadãos em terras obtidas em uma guerra (leia mais abaixo). Os assentamentos são amplamente vistos pela comunidade internacional como ilegais e como obstáculos à paz.
A ação da empresa de sorvetes com sede em Vermont, nos EUA, atraiu reprovação rápida do primeiro-ministro israelense Naftali Bennett, um ex-líder do movimento de assentamento na Cisjordânia, que a chamou de “uma decisão imoral e que acredito acabará sendo um erro comercial, também”.
A empresa informou ao seu licenciado de longa data - responsável pela fabricação e distribuição do sorvete em Israel - que não renovará o contrato quando ele expirar no final do ano que vem, de acordo com um comunicado publicado em seu site.
A declaração da Ben & Jerry's citou “as preocupações compartilhadas conosco por nossos fãs e parceiros de confiança”.
A empresa não identificou explicitamente essas preocupações mas, no mês passado, um grupo chamado Vermonters for Justice in Palestine pediu à Ben & Jerry's que “acabasse com a cumplicidade na ocupação de Israel e com os abusos dos direitos humanos palestinos”.
“Por quanto tempo mais a Ben & Jerry's permitirá que seu sorvete fabricado em Israel seja vendido em assentamentos apenas para judeus enquanto terras palestinas estão sendo confiscadas, casas palestinas estão sendo destruídas e famílias palestinas em bairros como Sheik Jarrah estão enfrentando despejo para abrir caminho para colonos judeus?”, questionou Ian Stokes, da organização, em um comunicado à imprensa em 10 de junho.
Em um comunicado na segunda-feira, a mesma organização disse que as ações de Ben & Jerry não foram longe o suficiente.
“Ao manter uma presença em Israel, a Ben & Jerry’s continua a ser cúmplice da matança, prisão e expropriação do povo palestino e da ostentação do direito internacional”, disse Kathy Shapiro do grupo de Vermont.
O Ministério das Relações Exteriores de Israel chamou a decisão da Ben & Jerry’s de “uma rendição à pressão contínua e agressiva de grupos extremistas anti-Israel” e disse que a empresa estava cooperando com o “terrorismo econômico”.
“A decisão é imoral e discriminatória, pois destaca Israel, prejudica israelenses e palestinos e encoraja grupos extremistas que usam táticas de intimidação”, disse o ministério em um comunicado, que também apelou à Ben & Jerry’s para retirar a sua decisão.
Embora os produtos da Ben & Jerry não sejam vendidos nos assentamentos, a empresa disse que ficará em Israel por meio de um acordo diferente. Mas será difícil fazer isso. As principais redes de supermercados israelenses, o principal canal de distribuição da sorveteira, operam nos assentamentos.
Causas sociais
Fundada em Vermont em 1978, mas atualmente de propriedade do conglomerado de bens de consumo Unilever, a Ben & Jerry’s não se esquivou das causas sociais. Enquanto muitas empresas agem levemente na política por medo de alienar os clientes, a fabricante de sorvetes adotou a abordagem oposta, muitas vezes defendendo causas progressistas.
A Ben & Jerry's se posicionou contra o que chamou de políticas regressivas do governo Trump, renomeando um de seus sabores Pecan Resist em 2018, antes das eleições de meio de mandato.
A empresa disse que Pecan Resist homenageava os ativistas que resistiam à opressão, práticas ambientais nocivas e injustiça. Como parte da campanha, a Ben & Jerry’s anunciou que doaria US$ 25 mil para cada uma de quatro entidades ativistas.
Dois territórios
A Cisjordânia e Jerusalém oriental foram capturadas por Israel na guerra de 1967 no Oriente Médio. Cerca de 700 mil colonos israelenses vivem agora nos dois territórios - cerca de 500 mil na Cisjordânia ocupada e 200 mil em Jerusalém Oriental.
Israel trata as duas áreas separadamente, considerando Jerusalém Oriental como parte de sua capital. Enquanto isso, Israel considera a Cisjordânia como um território disputado cujo destino deve ser resolvido nas negociações. No entanto, a comunidade internacional considera ambas as áreas como territórios ocupados. Os palestinos buscam a Cisjordânia como parte de um futuro estado independente, com Jerusalém Oriental como sua capital.
O Conselho Yesha, um grupo que representa os cerca de 500 mil israelenses que vivem em assentamentos na Cisjordânia, disse que “não há necessidade de comprar produtos de empresas que boicotam centenas de milhares de cidadãos israelenses por causa do lugar que escolheram para morar”. Ele disse que a decisão da Ben & Jerry “trouxe um mau espírito a uma indústria tão doce” e convocou os israelenses a comprar sorvete produzido localmente neste verão.
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Fonte: https://g1.globo.com/mundo/noticia/2021/07/19/ben-and-jerrys-anuncia-que-nao-ira-mais-vender-sorvetes-na-cisjordania-ocupada-e-em-jerusalem-oriental.ghtml